segunda-feira, 23 de junho de 2014

A ALEGRIA DE VOLTAR (Lc 15:11-24)

Chamamos essa história de "Parábola do Filho Pródigo" (pródigo quer dizer "esbanjador"), mas poderia ser chamada também de "A Parábola do Pai Amoroso", pois sua maior ênfase não é sobre a pecaminosidade do filho, e sim sobre a benevolência do pai. Ao contrário do pastor e da mulher nas parábolas anteriores, o pai não saiu à procura do filho, mas foi a lembrança da bondade do pai que levou o rapaz ao arrependimento e ao perdão (ver Rm 2:4). A história apresenta três experiências do rapaz.

Rebelião - ele foi para uma terra distante (w. 11-16). De acordo com a lei judaica, a parte da herança do filho mais velho correspondia ao dobro da parte dos outros filhos (Dt 21:17), e, se o pai assim o desejasse, poderia distribuir a riqueza ainda em vida. O filho mais novo agiu dentro da lei quando pediu sua parte dos bens e mesmo quando os vendeu, mas certamente não foi um gesto amoroso de sua parte. Foi como dizer ao pai: "Gostaria que estivesse morto!". Thomas Huxley disse: "As piores dificuldades de um indivíduo começam quando ele tem a possibilidade de fazer o que bem entende". Que grande verdade!

Sempre que damos mais valor a coisas do que a pessoas, mais importância ao prazer do que ao dever e nos interessamos mais pelas paisagens distantes do que pelas bênçãos em nosso próprio lar, estamos procurando problemas. Certa vez, Jesus advertiu dois irmãos em conflito: "Tende cuidado e guardai-vos de toda e qualquer avareza" (Lc 12:15). Isso porque, por mais coisas que possa obter, o avarento nunca fica satisfeito, e um coração insatisfeito leva a uma vida de decepção. O filho pródigo aprendeu do jeito difícil que é impossível desfrutar as coisas que o dinheiro pode comprar ao ignorar as coisas que o dinheiro não compra.

A "terra distante" não é, necessariamente, um lugar distante para onde vamos viajar, pois ela existe, em primeiro lugar, em nosso coração. O filho mais novo sonhava em "desfrutar" sua liberdade longe do pai e do irmão mais velho. Se a ovelha perdeu-se por falta de senso de direção e a moeda foi perdida por falta de cuidado, o filho perdeu-se por obstinação. Desejava fazer as coisas a sua maneira, por isso se rebelou contra o pai, entristecendo profundamente o coração dele.

Mas a vida na terra distante não era o que o jovem esperava. Seus recursos esgotaram-se, seus amigos o deixaram, veio a fome, e o rapaz foi obrigado a fazer por um desconhecido o que havia se recusado a fazer pelo pai: trabalhar! Essa cena dramática é a maneira de Jesus enfatizar o que o pecado faz na vida dos que rejeitam a vontade do Pai. O pecado promete liberdade, mas traz apenas escravidão (Jo 8:34); promete sucesso, mas traz fracasso; promete vida, mas "o salário do pecado é a morte" (Rm 6:23). O rapaz pensou que "se encontraria", mas, na verdade, se perdeu! Quando Deus é deixado de fora da vida, o prazer transforma-se em escravidão.

Arrependimento - ele caiu em si (w. 17-19). "Arrepender-se" significa "mudar de ideia", e foi exatamente isso o que o rapaz fez enquanto cuidava dos porcos (que trabalho para um rapaz judeu!). Ele "caiu em si", o que indica que, até então, estava "fora de si". O pecado traz consigo uma "insanidade" que parece paralisar a imagem de Deus dentro do indivíduo e liberar o instinto "animal". Os estudiosos dos textos de Shakespeare gostam de contrastar duas citações que descrevem essa contradição na natureza humana:
"Que obra-prima, o homem! Quão nobre pela razão! Quão infinito pelas faculdades! Como é significativo e admirável nas formas e nos movimentos!
Nos atos quão semelhante aos anjos!
Na apreensão, como se aproxima dos deuses..."
(Hamlet, II, ii)
"No seu melhor estado, é pouco pior que homem; no pior, pouco melhor do que animal".
(O Mercador de Veneza, I, ii)

O rapaz mudou de ideia sobre si mesmo e sobre sua situação e admitiu que era um pecador. Reconheceu que o pai era um homem generoso e que servir na casa dele era melhor do que ser "livre" naquela terra distante. É a bondade de Deus, não apenas a maldade do homem, que nos conduz ao arrependimento (Rm 2:4). Se o rapaz tivesse pensado apenas em si mesmo - na fome, na saudade e na solidão teria entrado em desespero. Mas suas circunstâncias difíceis o ajudaram a ver o pai sob outra ótica, e isso lhe deu esperança. Se o pai era tão bom com os servos, talvez se mostrasse disposto a perdoar um filho.

Se o rapaz tivesse parado nesse ponto, só teria sentido pesar e remorso (2 Co 7:10), mas o verdadeiro arrependimento implica não apenas a mente e as emoções, mas também a volição: "Levantar-me-ei [...] irei [...] lhe direi [...]". Nossas decisões podem ser nobres, mas a menos que as coloquemos em prática, jamais trarão qualquer benefício permanente. Se o arrependimento é, verdadeiramente, obra de Deus (At 11:18), o pecador obedecerá a Deus, crerá em Jesus Cristo e será salvo (At 20:21).

Regozijo - e/e foi até o pai (vv. 20-24). Nessa passagem, Jesus responde às acusações dos escribas e fariseus (Lc 1 5:2), pois o pai não apenas correu para receber o filho, mas também honrou sua volta, preparando um grande banquete e convidando o povo de sua vila a participar, O pai nem deixou que o filho mais novo terminasse sua confissão; interrompeu-o, perdoou-o e mandou que começasse a comemoração!

É claro que esse pai humano ilustra a atitude do Pai celeste para com os pecadores que se arrependem: ele é rico em misericórdia e graça e grande em amor por eles (Ef 2:1-10). Tudo isso é possível por causa do sacrifício de seu Filho na cruz. Não importa o que alguns pregadores (e cantores) dizem, não somos salvos peio amor de Deus; Deus ama o mundo todo e, no entanto, nem todo mundo é salvo. Somos salvos pela graça de Deus, e a graça é o amor que paga um preço.

No Oriente, não era apropriado a um homem de idade correr, mas o pai correu ao encontro do filho. Um dos motivos óbvios para isso era seu amor por ele e seu desejo de lhe mostrar esse amor. Mas há outra questão envolvida. O filho desobediente havia envergonhado a família e a vila, e, de acordo com Deuteronômio 21:18-21, deveria ter sido morto por apedrejamento. Se os vizinhos tivessem começado a apedrejá-lo, teriam acertado o pai que o abraçava! Que imagem maravilhosa do que Jesus fez por nós na cruz!

O filho descobriu no próprio lar tudo o que havia esperado encontrar na terra distante: roupas, jóias, amigos, uma comemoração alegre, amor e segurança para o futuro. O que fez a diferença? Em lugar de dizer: "Pai, dá-me", ele disse, "Pai, trata-me [...] como um de teus trabalhadores". Estava disposto a ser um servo! É claro que o pai não pediu que trabalhasse para merecer seu perdão, pois não há boas obras suficientes para salvar dos pecados (Ef 2:8-10; Tt 3:3-7). Na terra distante, o filho pródigo aprendeu o significado da miséria; mas, de volta ao lar, descobriu o significado da misericórdia.

O anel era um sinal de filiação, e "a melhor roupa" (sem dúvida, do pai) era prova de que o filho estava sendo aceito de volta na família (ver Gn 41:42; Is 61:10; 2 Co 5:21). Os servos não usavam anéis, sapatos nem roupas caras. O banquete foi a maneira que o pai escolheu para demonstrar sua alegria e para compartilhá-la com outros. Se o rapaz tivesse sido tratado de acordo com a lei, teria havido um funeral, não um banquete. Que bela ilustração do Salmo 103:10-14!

É interessante observar a descrição que o pai faz da experiência do filho: estava morto, mas agora está vivo; estava perdido, mas agora foi encontrado. Essa é a experiência espiritual de todo pecador que vai até o Pai pela fé em Jesus Cristo (Jo 5:24; Ef 2:1-10). Veja os paralelos entre a volta do filho pródigo para o pai e nossa volta para Deus por meio de Cristo (Jo 14:6):
O filho pródigo => Jesus Cristo
Estava perdido (v. 24) "Eu sou o caminho"
Era ignorante (v. 17) "Eu sou a verdade"
Estava morto (v. 24) "Eu sou a vida"
Só há uma forma de chegarmos ao Pai: pela fé em Jesus Cristo

Fonte: Comentário Warren W. Wiersbe

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